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A escola de Chicago
 

Muitas políticas públicas voltadas para os(as) que estão nas margens da sociedade podem fracassar por resultarem da presunção e da suposição de que já se sabe tudo sobre as pessoas que compõem esses coletivos. Essa crença nos autorizaria a supor que não é relevante escutar aqueles(as) que vão ser objeto de tal política; ou, pior, que eles e elas não teriam nada de interessante para nos informar.

Contrariando essa tendência, surgiu nos Estados Unidos, em meados dos anos 1930, um grupo de antropólogos que atentou para coletividades marginalizadas (em termos sociais, culturais ou econômicos) das grandes cidades daquele país: presos(as), usuários(as) de drogas ilícitas, musicistas de jazz, prostitutas etc. Esse grupo ficou conhecido como Escola de Chicago e teve entre seus principais nomes Everett Hughes e Howard Becker.

Um dos pioneiros da empreitada foi William Foote Whyte, cuja obra Sociedade de Esquina (2005) tornou-se um clássico daquilo que viria a ser conhecido como Antropologia Urbana.

Foote Whyte, que viveu três anos em um gueto habitado principalmente por imigrantes italo-americanos(as) da periferia de Chicago, desvelou uma série de códigos morais e de conduta por trás daquilo que, enxergado exclusivamente de fora, parecia ser uma comunidade dominada pela desordem e pela irracionalidade. Contrariando a visão estereotipada mais corrente, o autor descreveu uma profunda solidariedade governando as relações interpessoais que se verificavam dentro de uma gangue de jovens daquele bairro. Ele mostrou também que o jogo ilegal, administrado pela máfia italiana, não se inseria na comunidade exclusivamente através de um regime de terror, mas também por uma complexa trama de favores que acontecia dentro de uma hierarquia política muito bem consolidada.

William Foote Whyte. Fotografia de Phillip Capper (1996).

No Brasil, percebemos ecos da Escola de Chicago na obra do antropólogo Gilberto Velho (1998) – sua tese de doutorado, Nobres e anjos, editada mais de 20 anos após ser defendida, empreende um estudo do uso de tóxicos entre jovens da classe média carioca – e também no trabalho de Alba Zaluar (1985) – A máquina e a revolta, baseado em pesquisa de campo feita na hoje célebre Cidade de Deus.

Em ambos os estudos, está presente o mesmo esforço por revelar uma ordem estética, moral e política que permeia uma realidade normalmente apresentada como “caótica” ou “vazia de sentido”.